Obrigado, mãe
Hoje não vou falar de política, economia ou nenhum assunto ligado ao interior norte-rio-grandense. Hoje decidi escrever sobre mim, e compartilhar uma experiência que a cada dia me torna mais forte e consciente do real sentido da vida. Há um ano, em meio ao corre-corre cotidiano, me vi surpreendido por uma face assustada, seguida de uma colocação fria e marcada pelo medo. "Sua mãe foi ao médico! Terá que ir a Natal". A frase partiu do meu pai, num período onde os poucos minutos de descanso levavam a um natural isolamento, impedindo um contato mais próximo com meus familiares.
Neste instante, não havia como esconder a reação. Mesmo na tentativa de minimizar o impacto de uma realidade previsível, o sentimento reinante era o de um grande vazio interior. Como viver tão próximo de entes queridos e alimentar uma distância tão grande. Após a informação, baterias de exames e um sentimento amargo temperado pelo medo, chegou o grande dia. Foram minutos angustiantes de espera divididos com algumas revistas semanais e um ambiente mórbido cercado por pessoas marcadas por expressões tristes. Os passos que nos levaram ao consultório médico foram marcados por uma esperança anêmica. Após semanas de preparação psicológica, me deparava com a realidade mais dura em 29 anos de vida. "Assim como já esperávamos, a senhora terá que se submeter a um tratamento". Era a confirmação indireta marcada pela delicadeza de quem optou por viver no limite entre a esperança e a triste realidade da morte, para diagnosticar mais um caso de câncer de mama. Confesso que ter a certeza do diagnóstico me fez lembrar das pessoas que circulavam no interior do hospital com semblante triste, olhares abatidos e perdidos no infinito. Naquele momento eu tinha a certeza de que minha mãe estava condenada à morte; correto? Errado. Naquele instante eu acompanhava o nascimento de uma pessoa que há anos havia morrido e vagava pela vida na espera do dia final.
A saída do consultório jamais sairá da minha mente. Foram minutos silentes, sem a coragem de ver nos seus olhos o natural sentimento de medo. Foram minutos sem trocar uma única palavra simplesmente por não saber o que falar, e quando elas vieram, surgiram com a força de quem sabia o que estava falando. "Vai dar tudo certo". Naquele instante ouvi a partir das palavras da minha mãe, o simbolismo do choro de quem acabava de nascer. Confesso que hoje posso afirmar sem medo de arrependimentos. Contraditoriamente, naquele instante tive uma das mais importantes confirmações da minha vida. Vi morrer uma pessoa moribunda, desacreditada na vida e no real sentido que ela proporciona, sendo substituída por uma alma pura, alegre e compenetrada num único objetivo....Viver. Vi o nascimento de uma pessoa forte, que aprendeu a valorizar os pequenos detalhes da vida, que encarou o desafio de lutar contra o preconceito e os temores da morte, se transformar num dos maiores exemplos de vida que habita este mundo. Amanhã, por volta das 14h, minha mãe finalizará a terceira e última etapa de uma batalha que já dura um ano, e que não tem data para acabar. É apenas uma das várias batalhas que a vida reserva, não adianta fugir a esta sina. Após este período, é gratificante ver minha mãe chegar ao fim desta primeira batalha, como uma grande vitoriosa.
Não por superar as armadilhas impostas pelo viver, mas por ter encarado uma adversidade como oportunidade para viver intensamente. Aos que não entendem o motivo para um texto tão longo, íntimo e sentimental, peço que faça um favor. Recorte a coluna de hoje, imprima este texto caso seja leitor da Internet, leve à casa de algum familiar ou amigo acometido por uma doença qualificada como grave, e ajude esta pessoa a viver. A morte é a única certeza da vida, não temos como fugir. Mas gostaria que a minha experiência de vida... gostaria que o exemplo em que se transformou minha mãe, pudesse contribuir para a mudança na vida de quem se deixou abater pela dura realidade que invariavelmente cerca nossas vidas. Levante a cabeça, encare a realidade de frente. Aproveite cada dia, cada hora...cada minuto com a certeza de que o fim chegará para todos, mas que antes podemos superar as adversidades com o coração cheio de amor, de paz e de esperança. Para minha mãe não poderia deixar outra mensagem a não ser a de agradecimento. Obrigado, por mostrar a todos que a cercam que a vida tem um sentido especial. Obrigado, por ter ajudado a levantar minha cabeça quando o normal seria ver a sua baixar. Obrigado, por me convencer de que você foi capaz de ressuscitar, para mostrar que a morte virá, mas antes deste dia chegar, ficará a imagem de uma pessoa sorridente...vitoriosa e feliz por ter encontrado o real sentido do viver. Obrigado, mãe. Até a próxima terça-feira, caro leitor.
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